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Outros tempos...

 

Em chegando o mês de Agosto  pensava-se já na partida... As férias haviam durante tão pouco!... era assim todos os anos. Haviam terminado as festas de verão e sabia-se que o mês de Setembro era o da partida. E que custosa era ela.

Nem se apreciavam as uvas das latadas ou dos currais. Tudo era relegado a segundo plano. Renovava-se o enxoval, por pobre que fosse, arrumavam-se os compêndios das matérias  passadas e encaixotavam-se os restantes.
Aqui e ali iam-se fazendo as despedidas dos amigos e conhecidos.  Depois, era aguardar o dia da abalada: no iate do Pico, se o tempo ainda se conservava bom, ou no “Carvalho Araújo”.

A viagem era, normalmente, agradável pelos encontros com os colegas de outras ilhas, quer os vindos das Flores e Corvo quer  os que iam entrando nas ilhas onde o “vapor” aportava.

A bordo, verdade se diga, nem sempre eram bem tratados. O barco ia superlotado e não havia camarotes para todos. Os que viajavam em terceira classe passavam as tormentas do enjoo, da falta de acomodações, da péssima alimentação. Quase sempre vinte e quatro horas de tormentosa viagem.

Depois era a chegada ao lugar do destino. O encontro dos colegas que tinham vindo das ilhas de Leste. Uns já conhecidos de anos anteriores, outros os novos, embiocados, autênticos “bichos”, que só falavam com os colegas da mesma ilha e não esqueciam as grandezas da terra. Nem os morgados que ainda por lá existiam. Para eles só a sua terra era grande.

Depois os primeiros contactos com os professores, alguns ainda novos e que mal dominavam a disciplina que iam ministrar. Mas, pior o pessoal “menor” que  parecia tratar com animais saídos da jaula . E o ano ia correndo, com altos e baixos, sempre esperando noticias da família: dos pais, dos irmãos, alguns mais novos, dos avós e até dos primos. E quando o carteiro entregava as cartas, um misto de saudade se apossava do estudante ausente, aguardando as novidades da terra.

Hoje é tão diferente. Os telefones e mais recentemente os telemóveis, põem toda a gente em contacto permanente, e o que acontece numa ilha, minutos passados, já está nas ilhas ou continentes mais distantes. O progresso. Um progresso que não deixa de penalizar a economia, agora bastante abalada.  E vai durar a situação atrofiante, com as mais funestas consequências: o desemprego, a fome, a doença.

Os estudantes vão e voltam nos primeiros anos do curso. Depois, conseguidos vários conhecimentos, deixam de vir a férias. Terminados os cursos, por lá ficam, “mendigando”  uma colocação, qualquer que seja, e esquecem, primeiro a terra, depois a família. Toda a gente isto escreve mas de nada serve o clamor das famílias que por cá vão envelhecendo e, no fim da vida, são dolorosamente arrumadas nas casas da chamada “terceira idade” .

E a história vai-se repetindo todos os anos. E os alunos vão deixando de aparecer em férias. E as terras vão-se enchendo de mato e de faias, de canaviais e de brejo e de outra vegetação infestante. E um dia as estradas passarão a ser canadas, tomadas pela vegetação selvagem que as invade.

Os carros deixarão de circular. As carreiras das camionetas desaparecerão por falta de passageiros. O aeroporto, que tanto custou a conseguir, passará a uma vulgar pastagem. Os portos deixarão de ser frequentados  pelos barcos de cabotagem ou de passageiros. O turismo será um mito. As ilhas constituirão mais um grupo de “ilhas selvagens” que, de longe em longe, serão possivelmente visitadas “em missão de soberania”.

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